
Uma pergunta que nos tem perseguido desde os primórdios da humanidade é esta: Porque é que as pessoas boas sofrem?
Possivelmente, esta também foi a sua primeira grande questão ao entrar em contacto com o universo confuso, incompreensível, e (por vezes) cruel dos seres humanos. E, enquanto adulto, talvez este ainda seja o “Enigma” mais presente, nos bastidores da sua mente, quando observa cenas de sofrimento, ou testemunha injustiças e infortúnios.
De onde vem a ideia de pessoas “boas” e pessoas “más”
Se for como eu, esta pergunta emerge à sua mente à noite quando tenta resolver as questões mais perturbadoras da vida.
Mas de onde vem esta ideia de que as pessoas “boas” merecem o melhor da vida e que as pessoas “más” merecem ser castigadas?
Provavelmente, quando era criança, descobriu, tal como eu, que era recompensada pelas boas acções e castigada pelas más. Isso induziu-o a acreditar que as pessoas “boas” merecem ser recompensadas e as pessoas “más” devem ser castigadas.
Esta visão assenta sobretudo em crenças religiosas baseadas no Antigo Testamento em que Deus é encarado como o castigador supremo dos pecadores e protector dos justos.
O problema da dualidade bom/mau
O problema com a dualidade da linguagem bom/mau, justo/injusto é que somos levados a acreditar que o mundo é a “preto e branco”. E quando acreditamos que somos “boas” pessoas, é comum desenvolvermos um senso de legitimidade que nos leva a achar que devemos estar dispensados dos desaires da vida.
Esta falha na nossa estrutura de raciocínio faz com que fiquemos muito perturbados quando a vida não corre conforme planeámos. E muitas vezes não corre!
E quando alguma tragédia ou infelicidade nos atinge, bradamos com raiva ou horror: “Não FIZ mal a ninguém… Não MEREÇO este castigo! ” ou “Isto não é justo!” Só que, quando colocamos as coisas desta forma, na realidade estamos a sugerir que o sofrimento deveria estar destinado apenas às pessoas “más”. Mas, quem decide e qual a hierarquia de valores para tal?
Esta forma fracturante e bidireccional de ver o mundo é perigosa e a causa de muito do nosso sofrimento.
O perigo da visão do mundo a “preto e branco”
Se analisarmos friamente, estaríamos a afirmar que algumas pessoas seriam mais dignas do bem do que outras. Ou seja, deixaríamos de sentir empatia e compaixão.
Ora, essa seria uma visão contrária aos ensinamentos de Jesus que nos diz que Deus é todo amor incondicional e compaixão. E também não é a nossa natureza intrínseca.
Acredito que somos naturalmente empáticos e compassivos. A questão é que, enquanto seres humanos, tendemos a procurar o prazer e a evitar a dor – a nossa ou a de outros. E, quando experienciamos dor o nosso cérebro precisa de encontrar as causas para o sofrimento porque a dissonância cognitiva é desconfortável.
Portanto, não é uma questão de as pessoas “boas” serem recompensadas e as pessoas “más” castigadas. Isso não existe. O que queremos é dar um sentido à dor, mas ao resistir à realidade geramos mais sofrimento.
Se deseja saber mais sobre como aliviar sofrimento emocional este artigo é um bom ponto de partida
O que nos causa maior desconforto é o desfazer destas percepções ilusórias de “justo/injusto” ou “bom/mau” quando somos tocados pelo infortúnio.
Eu sei que é difícil lidar com sentimentos de impotência e incerteza. Eu também sinto (como muitos outros) ondas de medo e ansiedade. Como não?!
Resistir à realidade é a pior forma de auto-tortura
Eu já sofri muito (e por vezes ainda sofro) por resistir ao que É ou desejar que a realidade fosse diferente. Muita da infelicidade, sofrimento e negatividade humana, provêm da “resistência” a situações que já existem.
Resistir à realidade é a pior forma de auto-tortura.
Sofremos porque resistimos à vida e agarramo-nos ao que é ilusório, transitório e sujeito a mudanças, tais como pessoas, relações, promessas, identidades pessoais e ideologias.
Ironicamente, também tendemos a definir sofrimento e dor como uma e a mesma coisa, mas não são. Uma é antinatural (sofrimento) e outra é natural (dor); uma é um produto da mente e do ego (sofrimento) e a outra é um produto da existência (dor).
Então porque é que as pessoas sofrem – boas ou não?
Sofremos porque nos apegamos ao transitório e resistimos ao processo natural da vida – nomeadamente à dor, às mudanças, ao declínio e à morte. Por exemplo, quando alguém que amamos morre, sentimo-nos injustiçados. Porém, a morte é a única garantia que temos em relação à vida. E sofremos também porque acreditamos que podemos controlar a nossa vida, o nosso corpo, a nossa saúde, as nossas circunstâncias…
Sofremos porque queremos proteger o nosso sentido de identidade – Ego – contra “forças exteriores”, quando na realidade o sentido de identidade é uma construção ilusória da mente humana que reprime a verdadeira essência de quem se é: espírito, alma.
Quando finalmente conseguimos ver para além da falácia de conceitos como “pessoas boas” e “pessoas más” e compreendemos que a dor é inevitável, mas o sofrimento é opcional, as nossas vidas são libertadas do eterno enigma de: “Porque é que as pessoas boas sofrem?” Por fim, podemos compreender que, apesar de tudo nos poder ser tirado a qualquer momento já somos inatamente Inteiros, e podemos então ocupar a nossa humilde posição no grande plano divino – ou no jogo cósmico da vida/Universo.
Em conclusão
Quando deixamos de nos apegar e de resistir às coisas, deixamos de sofrer e começamos a sentir apenas dor, mas uma dor que se torna fugaz e temporária.
E, se acredita em Deus, poderá ser certamente útil, quando estiver no meio do sofrimento, manter-se humilde e recordar que o sofrimento nos ajuda a alcançar um amor mais profundo e propósito mais elevado, e lembrar que Deus é todo amor incondicional e compaixão.
P. S. Se se está a debater com algum desafio neste momento, este episódio do Podcast será uma mais valia para si.
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