Conforme referi no artigo anterior – “O que é a resiliência e como desenvolvê-la” – a resiliência não é uma competência inata. Nem é um traço de personalidade ou força de carácter. Então, se não é inato, como se tornar emocionalmente resiliente? É isso que vou abordar neste artigo.
Tipicamente, quando a vida nos troca as voltas, dizem-nos que temos de ser fortes. Porém, ser forte é diferente de ser resiliente.
Não se “nasce” resiliente! Ou seja, a resiliência é estimulada a partir das experiências que o indivíduo tem ao longo da vida. Portanto, é fomentada pelos diversos círculos em que se está inserido – família, escola, cultura, meio social, etc. As aptidões relativas a cada um dos princípios de construção de resiliência podem ser desenvolvidas e melhoradas intencionalmente.
A pesquisa científica identificou algumas variáveis (ou factores de protecção) que contribuem para a resiliência emocional.
Variáveis da resiliência
Os principais factores de protecção relacionados com a resiliência são: a biologia, autoconsciência, auto-regulação, agilidade mental, optimismo, auto-eficácia, conexão e instituições positivas.
Todas as habilidades inatas podem ser potenciadas e contribuir para desenvolver a resiliência.
1. Variáveis biológicas
Alguns dos factores que fomentam a resiliência residem na biologia. Quando o stress activa o corpo, o sangue é enviado para os músculos. Estes preparam-nos para realizar uma acção física – lutar ou fugir. O sangue é desviado de outros sistemas que ajudariam o corpo a se curar, a se restabelecer. Portanto, tem um impacto real.
As glândulas supra-renais segregam cortisol (uma das hormonas do stress). É ele que nos prepara para utilizar a energia armazenada e agir. Todavia, a longo prazo, afecta todo o corpo impedindo a cura e debilitando o sistema imunitário. O stress também está associado à diabetes e a outras patologias.
O nosso sistema nervoso foi construído para nos ajudar a adaptar à situação em que nos encontramos. Assim, quando somos ameaçados, na realidade é como se metade do sistema nervoso autónomo – o sistema simpático – , fosse activado.
A outra parte é gerida pelo sistema nervoso parassimpático. Este está envolvido na digestão, na absorção de alimentos e na sua utilização para curar ou restaurar o corpo. Facilita a reconstrução do corpo, a regeneração, a cura e a nutrição. Além disso, promove a homeostase durante o sono .
Estes dois sistemas estão sempre a funcionar em paralelo. Porém, a forma como se activam em cada contexto determina se matemos ou não esse equilíbrio.
2. Autoconsciência
A autoconsciência engloba outro conjunto de variáveis que fomentam a resiliência. Em primeiro lugar, é a capacidade para reparar nos pensamentos.
Raramente se prime o botão de pausa, só por um segundo, para se focar no que está a acontecer internamente. Com que frequência repara nos seus pensamentos? Apercebe-se se esses pensamentos estão a ajudá-lo na situação ou a atrapalhar?
Em segundo lugar, é a habilidade para rastrear as emoções.
As emoções têm um papel crucial na resiliência. Porém, muitos de nós não consegue identificar o que está a sentir, num dado momento, nem descrever as suas emoções. É preciso conhecer as emoções com precisão para responder de acordo com o que elas nos pedem.
Em terceiro lugar, além do rastreamento dos pensamentos e emoções, outra função da autoconsciência, é rastrear as reacções. Então, ter consciência de como reage numa dada situação, importa! É crucial saber se os seus comportamentos ou atitudes estão a ajudá-lo ou prejudicá-lo é crucial.
A fisiologia é outro elemento importante. Alguns de nós até podemos estar realmente sintonizados com o nosso pensamento e conscientes das nossas reacções. Mas será que conseguiríamos identificar o que está a acontecer nos nossos corpos?
Outro aspecto crítico da autoconsciência é o autoconhecimento. Ou seja, estar profundamente ciente de quais são os seus pontos fortes e fracos. É fundamental conhecer as suas forças e como alavancá-las para superar desafios. O mesmo se aplica às suas fraquezas e como as fortalecer para obter melhores resultados.
3. Auto-regulação
A auto-regulação reúne um conjunto de capacidades que a ciência diz serem importantes para a resiliências. São habilidades que se relacionam com a nossa aptidão para, não só reparar nos pensamentos, reacções e fisiologia, mas também para mudar esses pensamentos, emoções e fisiologia. Ou seja, é ser-se capaz de mudar, intencionalmente, as nossas respostas quando o que estamos a experienciar não está a ajudar numa situação.
Um outro elemento que se enquadra nessa categoria, é a definição de metas. Ter metas, ter uma missão, dá-nos algo em que focar. Ter uma visão do futuro que estamos a tentar alcançar, motiva-nos a agir.
4. Agilidade mental
Um outro factor importante é a agilidade mental. Agilidade mental é a capacidade de ver as coisas de várias perspectivas. É ser-se capaz de olhar para uma situação, não apenas de um, mas de múltiplos pontos de vista.
Outro aspecto da agilidade mental, crucial para a resiliência, é a capacidade para resolver problemas. Por outras palavras, ser-se capaz de reconhecer a causa-raiz de um problema e depois identificar ou criar soluções.
5. Optimismo
Outro dos grupos de variáveis enquadra-se sob o título de optimismo. O optimismo é crítico para a resiliência porque é a crença num futuro positivo. Isso é essencial para perseverar após um abalo de vida.
Parte do optimismo é ser-se capaz de aceitar o que não se pode controlar, na situação. Há aspectos que não podemos mudar e outros que podemos. Para fomentar a resiliência, é necessário separar o que não se pode mudar e agir sobre o que se pode alterar.
Algo que as pessoas resilientes fazem, é pensar nos stressores, não como ameaças, mas como desafios. Quando têm um problema pela frente, encaram-no como uma oportunidade de crescimento.
6. Auto-eficácia
A auto-eficácia ou mestria, engloba variáveis essenciais para se tornar emocionalmente resiliente. Saber quais são os seus dons e talentos, os pontos fortes e ter uma atitude confiante é crucial. A crença de que podemos dominar o nosso ambiente é crítico para a resiliência.
A força de carácter e o conhecimento de quem somos, contribui da melhor maneira possível, para uma alta auto-eficácia. Podemos usar os pontos fortes para lidar com os desafios.
Assim, a auto-eficácia, o autodomínio, é outro agrupamento de variáveis importante.
7. Conexão
Uma descoberta muito comum na literatura da resiliência envolve os relacionamentos. A conexão é outro conjunto de variáveis essenciais à resiliência. As crianças que se sentem seguras com os seus cuidadores, têm maior probabilidade de demonstrar resiliência, mais tarde. Ou seja, se têm um forte apego aos cuidadores na infância têm mais facilidade para se tornarem resilientes, na vida adulta.
Ter um relacionamento robusto, em que se sabe que, independentemente de onde se esteja e de onde a outra pessoa esteja, se pode contar com ela para nos apoiar quando as coisas ficam difíceis, é crítico. Portanto, ter conexões fortes é importante para desenvolver resiliência.
Assim, ter relações saudáveis, desde a infância e ao longo da vida, é preponderante. Os relacionamentos, são importantes para prever e contribuir para a resiliência. Mas a conexão não se limita às relações interpessoais.
Outro aspecto que parece ser muito importante para a resiliência é a espiritualidade. Sentir-se ligado ou conectado a algo maior que si mesmo. A conexão a algo maior do que nós mesmos também pode ser extremamente importante. Ter uma forte crença de que se tem algo pelo qual vale a pena lutar, importa.
8. Instituições positivas
O último grupo de variáveis pode ser descrito como instituições positivas.
Até agora, todos os aspectos abordados são variáveis que residem no indivíduo. Ou seja, residem nele ou nas pessoas com quem se relaciona. E essas variáveis são tremendamente importantes.
Mas também existem elementos relacionados com as instituições. Sejam elas a instituição familiar, a comunidade ou o local de trabalho, são redes de apoio. Estas instituições podem apoiar e estimular as variáveis interpessoais e intrapessoais, ou podem desgastá-las ao longo do tempo.
Portanto, se cresceu numa comunidade ou frequentou um escola onde não se sentia seguro será difícil se tornar emocionalmente resiliente. Se cresceu numa família onde as suas necessidades básicas não eram atendidas, será mais difícil manter altos níveis de resiliência.
Contudo, se, pelo contrário, frequentou escolas onde os atributos de resiliência são valorizados é mais fácil manter elevados níveis de resiliência. Ou se cresceu em comunidades e famílias onde se sentia apoiado tem mais chances de ser resiliente.
Tornar-se emocionalmente resiliente é mais uma decisão do que uma aptidão
Em resumo, a resiliência pode ser vista como uma interacção complexa entre características individuais e factores ambientais. Tudo o que é necessário para se tornar emocionalmente ágil é usar os recurso internos de forma intencional. Essas aptidões podem ser treinadas através de estratégias e técnicas específicas, incluindo as citadas acima.
Por outro lado, não são os eventos desafiantes que determinam a nossa resiliência. Portanto, é a gestão que fazemos desses desafios que a define. Muitas vezes, a resiliência para lidar com potenciais eventos traumáticos futuros desenha-se no dia a dia.
A resiliência é também determinante para a saúde, tanto mental como física. As pessoas resilientes conseguem encarar as adversidades com optimismo, identificando sempre o lado positivo de todas as situações.
Em conclusão, ser resiliente é ser capaz de se reerguer perante situações difíceis e enfrentar os desaires com fé.
Assim, ser resiliente não significa ignorar os acontecimentos nem fingir que não aconteceu nada. Nem é suposto agir como se estivesse tudo bem mesmo quando não está. Pelo contrário. Acima de tudo, é ter consciência do que aconteceu, enfrentar esses eventos e integrar na sua história de vida.
Portanto, procure extrair algo positivo dos momentos negativos e dos erros cometidos. Veja-os não como fracassos, mas como oportunidades de crescimento. Isso ajudará a mudar a sua perspectiva e pontos de vista.
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